Notícias de Criciúma e Região

Produtividade tóxica

A sociedade do cansaço precisa questionar seus ideais

Encontrar um ponto de equilíbrio entre produtividade e bem-estar virou um dos grandes desafios do nosso tempo. A obsessão pela produtividade como um dos principais pilares do sucesso nos impôs um custo alto. Como observa o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, nos tornamos a “sociedade do cansaço”.

Para um dilema tão complexo, não há resposta simples. Mas, para saber se existe esse ponto de equilíbrio ou se estamos condenados ao cansaço, cabe analisar com mais calma os conceitos de produtividade e sucesso.

A produtividade, quando expressa tudo o que um ser humano é capaz de fazer, é positiva. Evoluímos e melhoramos as condições de vida em muitos aspectos graças a homens e mulheres produtivos, que transformaram o mundo com trabalho e bom uso do potencial dos seus corpos e mentes. Admiramos quem consegue entregar bons resultados, seja em quantidade ou qualidade. A crítica, portanto, não é à produtividade, mas à produtividade a qualquer preço. E aí entramos na questão do sucesso.

Em um mundo baseado na lógica de mercado, solução é sinônimo de lucro. E, para que a solução valha mais, não basta que o problema apareça, ele precisa parecer realmente crítico. Por isso, não faltam discursos apontando áreas em que você ainda não alcançou “sucesso”. São tantos ideiais de corpo, beleza, saúde, alimentação, relacionamento, êxito profissional, conta bancária, experiências de vida… que nos sentimos sempre em falta. Ou seja, nosso “fracasso” fica constantemente em evidência. Para piorar, é comum sentirmos culpa, já que, supostamente, se fôssemos mais produtivos, resolveríamos os problemas e, assim, seríamos mais bem sucedidos.

É claro que bons resultados vêm na proporção do esforço. Não há escolha ou conquista sem um preço a pagar. Mas precisamos ao menos nos perguntar se estamos perseguindo desejos genuinamente nossos ou se estamos obcecados pelos ideais da cultura. 

Encontrar essa resposta ou fazer esse movimento não é simples, até porque também vamos perceber que é inevitável abrir mão de alguma coisa. Não damos conta de tudo e aceitar nossos limites às vezes é doído, fere o nosso narcisismo. A cultura capitalista se alimenta justamente dessa vulnerabilidade e, assim, somos mais facilmente capturados pelo discurso que nos incentiva a ultrapassar os próprios limites. Resultado: caímos na produtividade tóxica e o cansaço nos pega de jeito.

Mas é possível ser altamente produtivo. Muitos exemplos na história demonstram isso. Nas artes, nas ciências, nos mais variados campos de atuação humana, pessoas trabalharam incansavelmente até o fim da vida, movidas por seus próprios desejos e paixões.

Sobre o ponto de equilíbrio? Cada um tem o seu. Alta produtividade pode ser muito boa, desde que expresse quem você é e não quem a cultura e os outros esperam ou exigem que você seja.

***

Fábio Cadorin (@fabiocadorin) é psicólogo, jornalista, professor e doutor em Ciências da Linguagem. Nesta coluna fala sobre saúde mental e impactos da cultura sobre o psiquismo.

Você também pode gostar