O brasileiro passou os Ăşltimos dois anos sendo surpreendido a cada dia com novas notĂcias sobre corrupção. SĂŁo cifras bilionárias de dinheiro desviado do setor pĂşblico em conluio com alguns empresários para manter no poder – seja no Executivo ou no Legislativo – uma casta de polĂticos que desde o fim do regime militar governa o paĂs, se revezando entre governo e oposição. Enquanto o brasileiro precisa trabalhar cada vez mais para pagar impostos e o empresário enfrenta enormes dificuldades para manter seus negĂłcios em função da burocracia e da alta carga tributária – sem que nenhum deles tenha a contrapartida necessária – esse esquema que nĂŁo respeitou diferenças ideolĂłgicas continua envolvendo figuras de todo espectro partidário. Nem mesmo as manchetes foram capazes de frear essa sangria dos cofres pĂşblicos. Eles nĂŁo se envergonham mais, seja pela certeza da impunidade ou pela crença de que a memĂłria curta do eleitor irá lhes garantir a reeleição. Reeleição que eles tentam facilitar mudando as regras do jogo em benefĂcio prĂłprio.
Embora nĂłs cidadĂŁos tenhamos muitos motivos para lamentar, a verdade Ă© que toda crise traz oportunidade, de mudanças, de renascimento. E Ă© essa oportunidade que o Brasil nĂŁo pode perder. Entretanto, o que se desenha no Congresso Nacional – com ventos de conspiração – Ă© um remendo de Reforma PolĂtica que está sendo tramado para manter no poder justamente aqueles que sĂŁo alvos de investigação. Cabe lembrar que pelo menos 1/3 dos deputados e senadores estĂŁo sendo investigados no Supremo Tribunal Federal, onde o Ăndice de condenação dos rĂ©us Ă© inferior a 1% conforme estudo divulgado este ano pela Escola de Direito da Fundação GetĂşlio Vargas (FGV). É absurdo admitir que justamente esses investigados reformulem o sistema eleitoral com o claro objetivo de manter o foro privilegiado e as benesses de uma fartura regada com dinheiro ilegal.
O distritĂŁo, embora possa parecer Ă primeira vista uma maneira de simplificar a eleição, pois, por este sistema, elegem-se os deputados e vereadores mais votados, sem coligações e sem considerar a votação recebida pelos partidos, esconde algumas armadilhas que precisam ser consideradas. A maior delas Ă© a de personalizar ainda mais a polĂtica brasileira e a mais perigosa na realidade atual Ă© a de manter no poder os velhos caciques, pois, com o distritĂŁo, os partidos tendem a lançar apenas os nomes já conhecidos do eleitor, aqueles que já fazem parte do esquema. A chance de renovação, necessária como nunca, cai drasticamente com essa alteração na regra. Com o agravante que o modelo majoritário para escolha de deputados – o distritĂŁo -, sĂł Ă© utilizado em quatro paĂses – AfeganistĂŁo, Vanuatu, Jordânia e Ilhas Picárnias (um paĂs na Oceania com cerca de 50 moradores), que nĂŁo sĂŁo lá grandes referĂŞncias de democracia.
Desconectados da realidade, os deputados e senadores ainda querem implantar um fundo de R$ 3,6 bilhões para bancar as prĂłprias campanhas. Em qualquer Ă©poca, a medida soaria como absurdo. Mas a gravidade Ă© ainda maior em função da crise econĂ´mica que deixou um saldo de quase 14 milhões de desempregados. NĂŁo bastasse isso, o Brasil discute o tamanho do rombo nas contas pĂşblicas. O governo federal anunciou esta semana as novas metas fiscais do setor pĂşblico consolidado de 2017 a 2020, que incluem governo federal, estados e municĂpios. Com todas as mudanças, o rombo a mais projetado chega a R$ 199 bilhões. SĂł em relação a este ano, a meta pulou de um dĂ©ficit de R$ 143 bilhões para R$ 163 bilhões.
A situação polĂtica e econĂ´mica Ă© alarmante o que exige uma reforma de verdade – diferente desta que está sendo tramada -, sendo duas questões centrais. Primeiro Ă© necessário diminuir sensivelmente o nĂşmero de partidos, o que está previsto com o fim das coligações proporcionais e a cláusula de barreira, mas a regra deve ser mais rĂgida para ter efeito imediato, e, em segundo, mas nĂŁo menos importante, Ă© a adoção do sistema distrital, que poderia começar com distrital misto. AtravĂ©s deste Ăşltimo modelo, o eleitor teria dois votos para deputado federal (ou estadual ou vereador). O primeiro seria dado a um representante de seu distrito. O segundo, para um partido polĂtico que apresentaria uma lista com os nomes dos possĂveis deputados. Seriam eleitos o parlamentar votado de cada distrito e um representante da lista dos partidos mais votados. Por exemplo, em Santa Catarina, sĂŁo 16 vagas para deputados. Haveria uma divisĂŁo em oito distritos no qual um candidato sĂł poderia concorrer por um distrito. Ou seja, o candidato de Jaraguá do Sul nĂŁo poderia receber votos em Joaçaba – o que barateia os custos de campanha e aproxima o eleitor de seus representantes, duas necessidades bem atuais. Em cada distrito, cada partido poderia apresentar apenas um candidato. E o candidato mais votado de cada distrito garantiria sua vaga. Assim, metade das 16 vagas seria preenchida. Os outros oito representantes viriam do segundo voto, em uma lista prĂ©-definida pelos partidos e divulgada aos eleitores. Os partidos que recebessem a maior quantidade de votos na unidade da federação elegeriam proporcionalmente os seus deputados. O sistema Ă© similar ao adotado na Alemanha, considerada a repĂşblica onde há uma das mais igualitárias representação parlamentar no mundo.
O momento que enfrentamos Ă© crucial para o futuro do paĂs e das prĂłximas gerações, nĂŁo podemos ficar de braços cruzados enquanto as negociações sobre as mudanças nas regras eleitorais avançam no Congresso. Temos que nos posicionar e exigir dos representantes eleitos pelo voto que encerrem seus mandatos com dignidade, que façam uma Reforma PolĂtica pensando verdadeiramente em melhorar o sistema eleitoral. É preciso cobrar dos nossos deputados e senadores uma postura republicana.