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A estranha origem de palavras sujas do português, como “boceta”

Muitos palavrões começaram como termos inocentes

A maioria dos palavrões nasceu de termos inofensivos e utilitários que, por metáfora ou outras formas mais convolutas, acabaram designando coisas obscenas, tabus em conversas educadas. 
 
Um bom exemplo é caralho, que eu já contei por aqui sua origem, e que é usada hoje como sinônimo de pênis ou como interjeição para demonstrar espanto. O termo que vem do latim “caraculu”, que significa pequena estaca ou pau, o que na verdade é a pequena cesta que se encontrava no alto dos mastros das Caravelas, também conhecida como Gávea. Inclusive não citei na coluna sobre essa origem, mas a palavra passou a ser usada para designar o membro do touro na Antiguidade. Daí, pra virar sinônimo de pênis em geral foi um pulo.  
 
Outra palavra que é usada com o intuito de depreciação, é a puta, que como também já contei por aqui em latim, putta é menina, e que tem muitos derivados em português, como os termos amputar, computar, reputação, deputado, entre outros, e sua origem partiu da mitologia. Um outro palavrão que teve seu sentido alterado, e que vou contar hoje, você vai ver que tudo é questão de conhecimento, já que a origem não é tão obscena assim.


Boceta, que é sinônimo de vagina, tem origem no latim buxis, caixa de buxo — buxo, por sua vez, é uma árvore. Hoje, é palavra censurada, que temos que evitar em certos meios, trocando suas letras por asteriscos, taxando-a ou simplesmente a evitando. Esse termo, que faria minha mãe me dar um tapão na boca, caso o pronunciasse, já foi bem mais ingênuo até o final do século XIX. E veja só, e muitas vezes já dissemos que há pessoas tão queridas, que dá vontade de “guardá-las numa caixinha”, mas em 1728, certamente diríamos “tê-las numa boceta”. Isso porque o tal palavrão nada mais era do que um sinônimo para caixa pequena, geralmente de madeira ou de couro, praticamente, um estojo. 
 
O nome vem lá da Grécia Antiga, onde uma árvore muito comum para se fazer pequenas caixas era o buxo “Buxus sempervirens”. Pelo diminutivo de ‘buxus’, à caixinha foi dado o nome de ‘buxetta’. As gregas e romanas tinham preferência por essa madeira para suas pequenas caixas em que guardavam objetos de valor. Os formatos mais comuns dessas caixetas eram o redondo, oval ou oblongo, feita de materiais diversos e também usada para guardar pequenos objetos “uma boceta de confeitos”, caixa de rapé ou até mesmo bolsa de borracha para guardar fumo. Acredito que a popularização do fumo de corda facilitou a adaptação da palavra para associá-la ao ato de fornicação como ‘guardar o fumo’ em local apropriado. Sabe como é, ao matuto nenhuma comparação escapa. Logo, com a evolução da língua, elas foram chamadas de bocetas. 

Curiosamente, vagina veio do latim ‘vagïna’, que significava ‘estojo’. É interessante perceber como, com o mesmo significado, uma palavra virou termo técnico e a outra, palavrão. 
 
Por influência do francês ‘boucette’, a palavra chegou em português já com “C” no lugar do “X”. Ah, mais uma curiosidade que é bom citar, é que ‘boucette’ virou ‘boëte’ e depois ‘boîte’, em francês. Essa última, por sua vez, gerou ‘boate’ em português. Ou seja, boceta e boate são irmãs etimológicas. 
 
Até metade do século XX e muito ainda em Portugal, a palavra não era/é um palavrão. Foi em 1906 que o folclorista Vicente Chermont de Miranda, no seu ‘Glossario Paraense’, atestou que, na região amazônica, o nome servia para se referir à vulva. Talvez lá, então, tenha se originado esse significado diferente e que se tornou o mais popular. Há registros do termo associado ao órgão feminino em poemas portugueses do século 18. A associação se deve ao fato de ele ser o lugar em que está o tesouro da mulher.


A expressão ‘buceta’ que muito se ouve atualmente deve ter sua origem da lenda da boceta de pandora. Uma lenda diz que a expressão Boceta de Pandora é usada na mitologia grega para designar uma caixa portadora de todos os males. Essa caixa foi enviada por Zeus aos homens como presente através de Pandora, virgem de incomparável beleza que fora criada artificialmente. Prometeu advertira Epimeteu, seu irmão, a não aceitar nenhum presente de Zeus. 
 
Mas Epimeteu, que é desmemoriado (seu nome significa o que pensa depois), esquecido de suas palavras, abriu a caixa de Pandora seduzido pelos aparentes encantos da donzela, e os males que se encontravam dentro dela espalharam-se rapidamente sobre a Terra. Com sua atitude inconsequente, o irmão de Prometeu condena os homens a cumprirem uma terrível sentença: a de viverem, a partir de então, irremediavelmente assediados pelo mal. A boceta de Pandora foi o primeiro presente de grego da História. 
 
Outra lenda conta, que a Caixa de Pandora (ou Boceta de Pandora, apenas em Portugal) é uma expressão utilizada para designar qualquer coisa que incita a curiosidade, mas que é preferível não tocar (como quando se diz que “a curiosidade matou o gato”). Tem origem no mito grego da primeira mulher, Pandora que, contra as indicações que lhe tinham sido dadas, teria aberto um recipiente onde se encontravam todos os males que desde então se abateram sobre a humanidade, ficando apenas a esperança no fundo do recipiente. Existe algumas semelhanças com o mito judaico-cristão de Adão e Eva onde a mulher é, também, responsável pela desgraça da humanidade.

Provavelmente, devido à grande maioria dos atritos dos homens estarem ligados à mulher, convencionou-se dar à vagina esse nome. Com o passar do tempo, a Pandora foi deixada de lado, ficando só a boceta, que, com a tendência da língua de substituir o “o” pelo “u”, hoje já virou “buceta”, assim como “logar” (corruptela de “local”) virou “lugar”. A grafia “buceta” ainda não aparece no Dicionário Aurélio, mas certamente um dia irá aparecer.

O motivo do emprego da palavra é muito óbvio: a censura de se falar os nomes das partes pudendas do corpo humano fez com que emprestássemos todo tipo de nome para apelidá-los, seja por piada ou só por não ter de usar o termo técnico. O pintinho e a perereca estão aí para provar. 

Tá vendo como é questão de conhecimento, aquelas caixinhas que sua mãe ou sua avó guarda as joias e objetos de valor, são as bocetas delas. Obrigada pela leitura até aqui, espero que tenha gostado, semana que vem tem mais! Siga-me nas redes sociais:
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