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Há quase uma década, mais de 100 ex-funcionários do Porto de Imbituba aguardam solução para pagamento de direitos trabalhistas

Manifestação marca Dia do Portuário e pede resposta das autoridades responsáveis

Um calvário. Esta pode ser a melhor definição para toda a situação de injustiça e desrespeito, que 120 famílias vem passando há mais de oito anos. Isso porque, desde que a administração do Porto de Imbituba foi transferida da Cia Docas para a SCPar, os ex-funcionários aguardam pelo recebimento de suas verbas devidas e complementação de aposentadoria.

Durante este período, 24 trabalhadores e aposentados faleceram sem terem a oportunidade de seus direitos restabelecidos. Muitos ainda lutam para uma realocação no mercado de trabalho, visto que a atuação dos profissionais do setor portuário são especificas. Outros, ainda, seguem em preocupante situação financeira, em verdadeira penúria, pois foram dispensados sem nenhum direito, sem os devidos pagamentos, inclusive sem as devidas anotações em suas carteiras de trabalho.

Juliano Carvalho de Souza lembra, com muita tristeza, da situação de humilhação a que foram submetidos e, como se não bastasse, foram demitidos sem direito algum. “Eu estava de licença médica quando fui desligado e, mesmo desempregado, precisei pagar advogados para conseguir dar baixa na minha carteira de trabalho. Nestes anos, sem conseguir recolocação profissional, venho fazendo “bicos” para poder sustentar minha família”, relata o ex-funcionário que atuou no Porto por 14 anos.

Bruna Nunes, filha do ex-funcionário Jorge Ernesto Nunes, relata a situação pelo qual a família vem vivendo. Jorge foi diagnosticado com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), com a doença em fase avançada, ele vive acamado. A esposa, Susana, também está acamada, pois a há 10 anos, a família descobriu o Alzheimer. “Lembro da angústia do meu pai pela insegurança quando a SCPar assumiu o Porto de Imbituba. A vida financeira da nossa família ficou fragilizada, e é difícil, mesmo após estes anos, se reerguer sendo que o tratamento dos meus pais é caro e eles precisam de cuidados constantes”, explica. Ela e a irmã Aline, se revezam nos cuidados e ainda dividem o tempo com o trabalho, esposos e filhos.

“Salão do desespero” fala o ex-funcionário Júlio César Ribeiro Soares ao mencionar a sala onde os portuários que ainda atuaram por alguns meses eram transferidos. Com a chegada da nova administração, eram tratados com desprezo, como “personas non gratas” e sofriam muita perseguição. Com mais de 12 anos de experiência na área contábil do Porto, Júlio relata que só não perdeu a casa em que morava com a esposa e as filhas, por contar com a ajuda de familiares. “Trabalhei como servente de pedreiro e como chapeiro para poder sustentar minha família. Perdi minha saúde por conta da angústia que vivemos nos meses que sucederam a troca de administração, pois considerava o Porto a minha casa, onde passava mais tempo do que com a minha família”, conta.

Ricardo Geremias Vieira, representante dos trabalhadores, fala que os episódios vividos pelos ex-colegas foram traumáticos. “Muitos colaboradores da Companhia Docas já nos deixaram sem terem recebido as verbas devidas e complementação de aposentadoria às quais tinham direito, entre eles meu pai, e precisamos corrigir essa injustiça. Trabalhadores impedidos de acessar seus postos de trabalho, assédio moral, funcionários colocados na “geladeira”, sem função, sem saber o que iria acontecer. É lamentável que o lucro esteja acima da dignidade e do respeito daqueles que construíram a história do Porto de Imbituba”, finaliza.

Nesta quinta-feira, dia 28, data em que comemora-se o Dia do Trabalhador Portuário, do ex-funcionários, familiares e amigos irão realizar uma manifestação a partir das 10 horas, como pedido de resposta das autoridades responsáveis e da finalização deste inadmissível capítulo que foi traçado na história do Porto de Imbituba nos últimos 8 anos.

Entenda o caso:

Em dezembro de 2012, após uma batalha jurídica a União não renovou a concessão do Porto de Imbituba à Companhia Docas de Imbituba e firmou convênio de delegação com o Estado de Santa Catarina que passou a explorar o Porto por meio da SCPar Porto de Imbituba.

A ação foi baseada no fim do contrato de concessão e na Lei 9.227/1996, que autoriza a União a delegar Portos aos Estados e Municípios. Porém, o decreto 2.184/1997, contém cláusulas obrigatórias a serem assumidas por seus delegatários a partir da data da assinatura, entre elas a assumir todos os contratos de trabalho e passivos.

Todos os empregados permaneceram desenvolvendo suas atividades, e com a confirmação da equipe de Transição da ANTAQ informando que todos os contratos de trabalho seriam mantidos, bem como a complementação de aposentadoria. Os processos seguem em tramitação na justiça, e os trabalhadores aguardam por uma decisão definitiva. O Porto conta hoje com mais de 50 beneficiários na faixa de 50/90 anos com 100 meses sem receber suas complementações de aposentadoria, afetando diretamente sua alimentação e compra de medicamentos.

De acordo com o advogado Orlando Gonçalves Pacheco. “É necessário reparar, imediatamente, a injustiça sofrida pelos trabalhadores. É preciso que o Governo do Estado e Federal corrijam esse equívoco realizado. É indispensável ter a consciência de que a construção e o bom andamento do Porto de Imbituba se deu pelos Trabalhadores Portuários da nossa cidade. Nossos trabalhadores tem expertise portuária necessária e, não devem ser tratados dessa forma. Repito, os trabalhadores portuários imbitubenses merecem respeito”, finaliza.

Fraude no convênio de delegação

O processo engloba, ainda, possui uma denúncia de fraude envolvendo a transcrição da Lei. De todos os Portos que foram delegados através da Lei aos Estados e Municípios, o Porto de Imbituba foi o único que não incorporou o quadro funcional de trabalhadores à nova gestão. Isso porque na transcrição do convênio, houve conluio para frustrar os direitos assegurados em lei, transcrevendo de maneira diferente a obrigação de assumir todos os contratos e passivos na data da delegação.

Na condução do processo interno de delegação do Porto de Imbituba, já existiam todos os pareceres do Ministérios dos Portos, ANTAQ, Advocacia Geral da União, entre outros, para que os ex-funcionários do Porto de Imbituba/SC ficassem resguardados e seguros quanto as obrigações trabalhistas. Mas houve uma alteração de cláusula, infringindo a lei, e deixando os ex-funcionários do Porto de Imbituba à deriva, tornando o único porto do país que está nessa situação.

Outra irregularidade apontada, é em relação ao pagamento de complementação aos trabalhadores aposentados. O Governo Federal instituiu aumento de 5,5% na tarifa do Porto de Imbituba, para o pagamento da complementação sendo que, durante décadas, foi cumprido não apenas em Imbituba, bem como, nos demais Portos objeto desta obrigação.

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